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Humberto de Campos (Irmão X) [*]

Em torno da mediunidade

Ali, no movimentado salão do Carnegie Hall, em Nova Iorque, encontramos famosa médium, a que emprestaremos tão-só o nome de Sra. Hayden, e de quem ouvíramos as melhores referências no Plano Espiritual.

Marcado o encontro pela intervenção afe­tuosa de nosso amigo Fred. Figner, fomos recebidos pela distinta senhora desencarnada, para conversação de alguns minutos.

A Sra. Hayden, orientadora de assuntos medianímicos, em vários círculos doutrinários dos Estados Unidos, recebeu-nos com extrema bondade, e, porque a víssemos cercada de amigos, naturalmente em atividades inadiáveis, firmamo-nos no objetivo direto de nossa visita, depois das saudações fraternais.

— Sra. Hayden — começamos —, se possível, estimaríamos ouvi-la em algumas perguntas sobre mediunidade...

—Minha experiência — comentou a inter­pelada — nada possui de notável...

E sorrindo:

— Mas pergunte o que deseje e responderei o que possa.

Sabíamos que a entrevistada, desde os primórdios do Espiritismo, na América, se fizera amiga pessoal do Juiz John Edmonds, do professor   Robert Hare, da Sra. James Mapes, de Emma Hardinge e outros pioneiros do movimento espírita na Terra, e considerei:

— Não desconhecemos que a senhora estuda a mediunidade, desde as bases da Doutrina Espírita no mundo...

— Sim — aprovou —, tenho essa honra.

E o nosso diálogo prosseguiu:

— Que nos diz acerca da mediunidade, no momento atual do Planeta?

— Questão ainda nova, tão nova como quando nos aventuramos a praticá-la, há precisamente um século. Temos longo tempo, diante de nós, para examiná-la, conhecê-la, educá-la.

— Mas, a Ciência e a Religião?...

— Duas forças que, até agora, ainda não puderam compreendê-la. Com a veneração que lhes devemos e acatadas as exceções, não será lícito ignorar que os cientistas, até hoje, se es­forçam, quase sempre, não em estudá-la mas em dissecá-la, como quem anatomiza grãos de trigo verde, querendo encontrar o pão feito; e os religiosos, muitas vezes, unicamente procuram cercear-lhes os vôos, sob capas mitológicas, interessados em prestigiar a superstição.

 

— Acredita, no entanto, que as realizações da mediunidade são retardadas tão-só pela influência de cientistas e religiosos?

— De modo algum. A mediunidade é uma força neutra, qual o magnetismo e a eletricidade, que não são bons e nem maus em si. O homem é quem lhes caracteriza as aplicações. Todos sabemos que milhares de indivíduos, encarnados e desencarnados, abusam da mediunidade, como os falsários criam chantagem com o dinheiro ou os impostores exploram a palavra, envilecendo-a na demagogia.

— A senhora crê na possibilidade de se coibirem semelhantes abusos pelo estabelecimento, na Terra, de um instituto central de controle dos fenômenos mediúnicos?

— A questão é de consciência pessoal. Já pensou o que seria do mundo, nas condições morais em que ainda se encontra, se apenas um grupo de nações ou pessoas pudesse controlar a potência do Sol? As ocorrências medianímicas pertencem ao domínio da verdade; por isso mesmo, devem estar com todas as criaturas, no grau evolutivo em que se vejam, em regime de liberdade, conquanto saibamos que todo médium dará contas aos Poderes Orientadores da Vida quanto àquilo que faça de suas próprias faculdades.

— Sra. Hayden, estamos convencidos de que a mediunidade é característica peculiar a todas as pessoas. Apesar disso, a senhora crê, tanto quanto nós, que muitos Espíritos reencarnam com mandatos especiais para desenvolvê-la e honorificá-la?

— Perfeitamente.

— E como explicarmos a falência de tantos médiuns no mundo?

— Isso não sucede exclusivamente nos do­mínios da mediunidade. O amigo admite que os tiranos em política, os sicários da cultura intelectual que supõem desacreditar a Ciência com atos de crueldade e os fanáticos em Religião hajam nascido na Terra para fazerem o mal que causam? Identificamos companheiros transviados na mediunidade, como é fácil de conhecê-los nos círculos da fortuna, da inteligência, da administração...

— Que diz a isso?

— Que, por enquanto, somos, no conjunto, a família humana do Planeta, com imperfeições, paixões, erros e bancarrotas, inerentes à nossa posição de Espíritos em aperfeiçoamento gradativo, caindo agora e levantando depois, aprendendo e melhorando sempre.

— Em seu ponto de vista, como promover a elevação do conceito de mediunidade?

— Separar o fenômeno mediúnico da dou­trina do Espiritismo, definindo fenômeno por matéria de observação e doutrina como sendo a luz que o esclarece.

— A senhora conhece a Codificação Kardequiana?

— Sim.

— Se fosse solicitada a falar para os ir­mãos de língua inglesa, encarnados na Terra, com vistas à obra de Allan Kardec, permitir-nos-á, por obséquio, saber o que diria?

— Se isso me fosse possível, convidaria todos os amigos e associados de ideal, de formação anglo-saxônia e latina, para o estudo generalizado dos temas e interesses espíritas e espiritualistas, em benefício da Humanidade, a começar dos mais humildes agrupamentos de opinião. Esses assuntos fundamentais da alma, da imortalidade, da evolução, da reencarnação, do destino, da dor e da justiça precisam sair do ambiente estreito dos simpósios para a analise clara e simples do povo.

— Sra. Hayden, desejando centralizar o nosso entendimento no que se relaciona com a mediunidade, muito nos agradaria ouvi-Ia sobre o que pensa, neste outro lado da vida, quanto à mistificação mediúnica.

— O irmão diz muito bem, quando afirma «neste outro lado da vida», porque, no campo físico, habituamo-nos a ver o empeço de manei­ra excessivamente sumária. A mistificação medianímica assume agora para mim aspectos multiformes, de vez que, se em alguns casos raros, podemos reconhecê-la movida pela má-fé, na maioria absoluta das ocorrências necessitamos compreender o papel da hipnose, da compulsão, do reflexo condicionado ou do processo obsessivo dentro dela. Discriminar mistificações mediúnicas, separando-as de fatos autênticos da mediunidade, não é tão fácil...

— Que sugere para a solução do problema?

— Trabalhar e estudar, cada vez mais. Os sábios das Esferas Superiores nos inspiram e guiam, mas não efetuam por nós a tarefa que nos cabe fazer.

— Mas, as fraudes mediúnicas, Sra. Hayden, que pensar das fraudes mediúnicas que plantam a dúvida e a negação entre os homens? Porque os sábios das Esferas Superiores não as proíbem irrevogavelmente?

— A notável seareira do Espiritismo, na América, sorriu de enigmático modo e acrescentou:

— Ah! Meu amigo, a dúvida é permitida pela Bondade Divina, em benefício da fraqueza humana. A fraude mediúnica, se prejudica de um lado, mostra função seletiva de outro. Muita gente que se gaba de cultura e discernimento não suportaria, de chofre, as verdades do Mundo Espiritual. Existem Espíritos que reencarnam prometendo prodígios de fidelidade e serviço, na obra do Senhor; entretanto, depois de se constituírem seguramente no corpo físico, voltam às tentações que noutro tempo lhes conturbavam o campo íntimo e recuam dos propósitos de elevação... Ainda assim, são criaturas boas e nobres. O Senhor, então, permite que elas duvidem das realidades espirituais e aceita, generosamente, que lhe neguem até mesmo a existência, de modo a que se inclinem para outras tarefas, não tão heroicas quanto as da confiança e da lealdade ao Bem até às últimas conseqüências, mas igualmente construtivas e meritórias... Tornarão à fé mais tarde, enquanto os companheiros mais amadurecidos seguem, com a bênção do Senhor, para a frente.

Uma campainha retiniu.

Os minutos previstos para a conversação haviam terminado.

A Sra. Hayden despediu-se e nós ficamos repentinamente a sós, no grande salão, com fome de silêncio e com sede de pensar.

 

4 de Agosto de 1965, em Nova Iorque, NY, EUA

 

(Mensagem do livro Entre irmãos de outras terras, psicografado pelo médium Francisco Cândido Xavier).

 

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